sexta-feira, 31 de julho de 2009

O último poema


Assim eu quereria o meu último poema.
Que fosse terno

dizendo as coisas mais simples
e menos intencionais.

Que fosse ardente
como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores

quase sem perfume.

A pureza da chama

em que se consomem os diamantes
mais límpidos
A paixão dos suicidas

que se matam sem explicação.

Manuel Bandeira

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Pescaria



Cesto de peixes no chão.
Cheio de peixes, o mar.
Cheiro de peixe pelo ar.
E peixes no chão.

Chora a espuma pela areia,
na maré cheia.

As mãos do mar vêm e vão,
as mãos do mar pela areia
onde os peixes estão.

As mãos do mar vêm e vão,
em vão.
Não chegarão
aos peixes do chão.

Por isso chora, na areia,
a espuma da maré cheia.

Cecília Meireles

quarta-feira, 29 de julho de 2009

terça-feira, 28 de julho de 2009

Havemos de voltar


Havemos de voltar!
Mais velhos...
Diferentes...
Derrotados...
Cinzas...
Pó...
Sementes
arrastadas pelo vento
num pôr de sol de fogo...
Levados na fúria da maré...
Mas havemos de voltar
numa trovoada tropical,
derrubados
beijaremos a terra
e voltaremos, serenos,
a florescer no capinzal.

Isabel Branco
(poetisa angolana)

Memórias


"O passado continua vivo dentro de nós através das memórias, mas as memórias em si não constituem um problema. Na realidade, é através delas que aprendemos com o passado e com os erros do passado.

Só quando as memórias, ou seja, os pensamentos sobre o passado nos dominam por completo é que se transformam num fardo, se tornam problemáticas e passam a fazer parte da nossa identidade.

A nossa personalidade, que é condicionada pelo passado, transforma-se então numa prisão. As nossas memórias estão imbuídas de uma noção de identidade, e a nossa história converte-se na pessoa que julgamos ser.

Este "pequeno eu" é uma ilusão que encobre a nossa verdadeira identidade, a Presença intemporal e informe."

Eckhart Tolle

segunda-feira, 27 de julho de 2009

domingo, 26 de julho de 2009

sábado, 25 de julho de 2009

Para ti


O tempo passa
A vida acontece
A distância separa
As crianças crescem
O amor diminui
Os corações quebram-se
As carreiras terminam
Os trabalhos vêm e vão
Os colegas esquecem-se dos favores
Peço-te para vires, respondes que vens mais tarde
Queria que estivesses sempre lá
Não importa por quanto tempo...
Nem qual é a distancia
Tu nunca estás a mais...
Preciso que estejas lá
Pelos teus caminhos, sejam quais forem, estarei sempre lá,
Puxando por ti, alegrando-te, orando por ti, intervindo, esperando de braços abertos até
ao fim da tua caminhada.
Às vezes quebrarei as regras
Caminhando ao teu lado
Levando-te ao colo.
O mundo não será o mesmo se estiveres sempre lá
E nós também não
Quando decidi enfrentar o teu mundo
Não tinha ideia dos desafios, dos duelos, nem das alegrias incríveis que ia encontrar
Nem sabia do quanto iria precisar de ti.

Suzete Madeira
(poeta moçambicana)

sexta-feira, 24 de julho de 2009

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Minha, eternamente!


(...)

Terra!
Minha, eternamente!
Terra das acácias,
dos dongos,
dos cólios, baloiçando
mansamente... mansamente!...
Terra!
Ainda sou a mesma!
Ainda sou
a que num canto novo,
pura e livre,
me levanto,
ao aceno do teu Povo!...

Alda Lara

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Herança


Aqui está a minha herança - este mar solitário,
que de um lado era amor e, do outro, esquecimento

Cecilia Meireles

Quando sorris


Eu estou sempre presente na tua vida. Sempre e de todas as maneiras. Mas tu
tornas-te muito mais consciente da minha presença quando fazes este tipo de
coisas:
quando sorris,
ou amas,
ou cantas,
ou danças,
ou escreves aquilo que te vai no coração.
É essa a mais alta versão de
Quem Eu Sou,
e sempre que exprimes essas qualidades,
estás a exprimir-Me.
Literalmente.
Estás a exteriorizar-Me.
Estás a tirar-Me de dentro de ti,
onde resido sempre,
e a mostrares-Me ao mundo.


Neale Donald Walsch

Careless love

terça-feira, 21 de julho de 2009

O anseio do encontro antigo


... O teu silêncio é a minha voz mais funda,
O teu querer, a minha esperança intensa,
...
E a solidão que de alma a alma aumenta
O anseio do encontro antigo,
É a inarmonia...
Reúne-te comigo no meu chamamento,
Reúne-te comigo ao que nos demora,
E levemos connosco o fim desta espera!


Ana Hatherly

domingo, 19 de julho de 2009

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Antínoo


Sob o peso nocturno dos cabelos
Ou sob a lua divina do teu ombro
Procurei a ordem intacta do mundo
A palavra não ouvida

Longamente sob o fogo ou sob o vidro
Procurei no teu rosto
A revelação dos deuses que não sei

Porém passaste através de mim
Como passamos através da sombra


Sophia de Mello Breyner Andresen

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Quando tu passas por mim


Quando tu passas por mim
Por mim passam saudades cruéis
Passam saudades de um tempo
Em que a vida eu vivia a teus pés

Passam coisas que eu quero esquecer
Beijos de amor infiéis
Juras que fazem sofrer

Quando tu passas por mim
Passa o tempo e me leva pra trás
Leva-me a um tempo sem fim
A um amor onde o amor foi demais

E eu que só fiz te adorar
E de tanto te amar penei mágoas sem fim
Hoje nem olho pra trás
Quando tu passas por mim

Vinicius de Moraes

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Gajaja



Fruto pálido, empaludado…
Cereja dos trópicos
de cor desmaiada.

Luanda:
onde estão as tuas gajajeiras
que a troco dos seus frutos
pedradas eu lançava
pedradas que magoavam
pedradas de criança!

Por certo que foram destroçadas,
sepultadas em teus alicerces
da Brito Godins
e de todas as Ingombotas,
tal como os frondosos cajueiros.

Vi hoje uma gajajeira
já quase morta.
Havia pedras a seu lado,
areia e cimento
e um buraco longo, rodopiando,
fazendo quadrados,
rectângulos, quadrados…

Se a minha fortuna
não fosse feita de sonhos,
compraria aquele terreno.
A copa da gajajeira
seria o meu chapéu,
a umbela dos dias quentes
e das noites de luar e de cacimbo.

Luanda:
onde é que estão
as nossas gajajeiras?
Essas gajajeiras que me davam
as gajajas da minha infância
os frutos da minha vadiagem!
Eu atirei pedradas!

Mas tu, Luanda,
o que fizeste delas?

Tomás Jorge publicado
(poeta angolano)

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Não é preciso muito mais

Tela de Leonid Afremor

Acordei de repente no meio da noite na rua alguém chamara:...
Então o nome correu pelos ares...
...
O nome passa por mim correndo vem ter comigo grita-me aos ouvidos
...
Com o meu nome caio em mim
...
É um nome muito tranquilo. Pacífico mesmo.
Para dizer ... com força é preciso estar-se muito zangado. Normalmente
move-se
apenas a língua levemente dentro da boca. Não é preciso muito mais.


Ana Hatherly

terça-feira, 7 de julho de 2009

segunda-feira, 6 de julho de 2009

uma vez basta...

Acalanto da rosa


Dorme a estrela no céu
Dorme a rosa em seu jardim
Dorme a lua no mar
Dorme o amor dentro de mim

É preciso pisar leve
Ai, é preciso não falar
Meu amor se adormece
Que suave o seu perfume

Dorme em paz rosa pura
O teu sono não tem fim

Vinicius de Moraes

Plantando sonhos


No canto do fim do mundo
há uma flor
contando histórias

À porta da minha casa
há uma planta
plantando sonhos

Domingos Florentino

(poeta angolano)

sexta-feira, 3 de julho de 2009

A primeira palavra


Aproxima o teu coração
e inclina o teu sangue
para que eu recolha
os teus inacessíveis frutos
para que prove da tua água
e repouse na tua fronte
Debruça o teu rosto
sobre a terra sem vestígio
prepara o teu ventre
para a anunciada visita
até que nos lábios humedeça
a primeira palavra do teu corpo

Mia Couto